Economia

Políticos e ratings põem banca sob pressão. Bancos vão apresentando medidas (e BPI até paga pensões mais cedo)

4 abril 2020 21:52

miguel figueiredo lopes / presidency of the republic handout

De antecipação de pagamento a fornecedores a cancelamento de dividendos, os bancos têm defendido que estão a ajudar a economia. Vozes da direita, esquerda e centro têm considerado que não chega e defendem que chegou a hora da banca retribuir aos portugueses as ajudas dadas no passado. Marcelo juntou-se este sábado

4 abril 2020 21:52

A pressão sobre o sector bancário português vem da direita (PSD), da esquerda (BE e PCP), do Governo e também da Presidência da República. Todos querem que a banca ajude o país na atual crise, depois de anos em que foram colocados dinheiros públicos no sistema. Os bancos têm vindo a apresentar medidas, e defendem que elas até vão além do regime criado pelo Governo nas moratórias de crédito. Nas últimas 24 horas, o Santander Totta confirmou que vai reter os dividendos que ia mandar para a casa-mãe em Espanha e o BPI vai pagar as pensões na segunda-feira, e não dia 9, como habitualmente.

À boleia da reunião que vai fazer com os grandes banqueiros na próxima segunda-feira, como noticiado pelo Expresso, o Presidente da República fez este sábado, 4 de abril, declarações sobre o papel que a banca deve desempenhar na economia. A banca tem de entrar na corrida contrarrelógio. A economia precisa do dinheiro mais cedo. Um dia mais tarde é pior que um dia mais cedo”, declarou. “A economia precisa do dinheiro mais cedo, porque as famílias precisam do dinheiro mais cedo, porque os trabalhadores precisam de trabalho mais cedo, precisam de salários mais cedo”, continuou Marcelo Rebelo de Sousa.

Apesar de considerar que é altura de a banca “retribuir aos portugueses” (pela entrada de mais de 20 mil milhões de euros estatais na última década), o Chefe de Estado também assumiu que “é muito popular bater na banca”.

E é isso que tem acontecido no campo político. Esta semana, Rui Rio, líder do PSD, afirmou que “será uma vergonha e uma ingratidão” se os bancos apresentarem lucros neste e no próximo ano.

Já Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda, chegou-se à frente com uma proposta em que quer impedir a distribuição de dividendos pelos bancos, mas também limitar comissões e spreads nas linhas de crédito criadas pelo Governo, mas que chegam às empresas através dos bancos - e para a qual quer o apoio de Rui Rio. Também o PCP quer moratórias, mas também limites na distribuição de lucros aos acionistas - impõe-se à banca, disse Vasco Cardoso, da comissão política, "um papel central no estímulo à atividade económica".

Do lado do Governo, também tem havido a indicação de que os bancos têm de agir: “agora é a fase de serem os bancos a ajudarem todos aqueles que são essenciais serem ajudados, de forma a que os rendimentos possam ser assegurados, a atividade económica possa continuar”, afirmou já o primeiro-ministro, António Costa.

Bancos vêm apresentando medidas

Da sua parte, os bancos têm vindo a anunciar medidas de apoio à economia, defendendo até que as suas propostas vão além do que está definido legalmente pelo Governo. Um exemplo é a questão da suspensão das prestações de crédito à habitação e a empresas – há bancos que, além destas, também permitem que haja moratória para crédito ao consumo, incluindo automóvel.

Outro argumento é que, mesmo antes de o Executivo eliminar comissões fixas nos terminais de multibanco dos comerciante, já algumas entidades as tinham suspendido ainda que os bancos também sofram críticas na disponibilização das linhas de crédito a empresas.

Mas a apresentação de medidas continua e os bancos fazem questão de as tornar públicas. Ainda esta semana, BCP, Novo Banco e Santander vieram comunicar que estão a pagar mais rapidamente aos seus fornecedores, para manter essas pequenas e médias empresas a funcionar.

Santander diz poder emprestar agora mais 8 mil milhões

Pedro Castro e Almeida, presidente executivo do Santander Totta

Pedro Castro e Almeida, presidente executivo do Santander Totta

antónio cotrim/lusa

Mas há mais. Depois de CGD e BCP anunciarem que não vão pagar dividendos (também porque o Banco Central Europeu a isso obrigou), o Santander Totta veio confirmar que também ele não vai pagar parte dos lucros de 2019 à sua casa-mãe, o banco espanhol Santander.

A decisão agora tomada permite reforçar ainda mais a capacidade de disponibilizar crédito à economia nacional na presente conjuntura. Esta decisão permite reforçar a capacidade de concessão de crédito à economia em cerca de 8 mil milhões de euros”, assinala o banco liderado por Pedro Castro e Almeida em comunicado.

O banco frisa que poderia distribuir os dividendos (no ano passado, foram de 495 milhões de euros) e que mesmo assim ficaria com folga nos seus rácios de capital.

BPI antecipa pensões

Já este sábado, foi o BPI a fazer um anúncio, ainda que este banco mantenha a intenção de pagar dividendos ao seu acionista, o banco catalão CaixaBank.

“O BPI vai antecipar o pagamento de todas as pensões aos seus clientes para dia 6 de abril, 2ª feira (três dias antes da data habitual de pagamento, todos os dias 9 de cada mês)”, assinalou o banco em comunicado às redações, acrescentando que “não vai cobrar qualquer juro (taxa 0%)” e ainda que “suportará todos os custos da antecipação”.

Neste campo, o banco está também a organizar marcações para clientes com mais de 65 anos que queiram receber a pensão no balcão, para que não acorram todos ao mesmo tempo às agências.

Pablo Forero, presidente executivo do BPI

Pablo Forero, presidente executivo do BPI

josé fernandes

Mas há uma nova (embora antiga) fonte de pressão

Estas medidas são implementadas quando é certo que a atual situação económica, que já está a paralisar a economia - e a levar a despedimentos coletivos e lay-offs, vai também afetar os bancos. Embora os créditos abrangidos pela moratória criada pelo Governo possam não pesar nos rácios de malparado, os clientes que já estavam com dificuldades antes da covid-19 não podem a ela aceder, e vão ter ainda mais dificuldades no encontro de soluções para a regularização das suas situações.

E, neste contexto, já há uma nova fonte de pressão, que não apenas a política. São as agências de rating, de má lembrança para o sector desde os tempos da troika, quando Portugal e a banca estiveram sob decisões repetidas de reduções de classificação de risco da sua dívida.

Esta sexta-feira, a Fitch decidiu manter os “ratings”, mas rever as perspetivas que atribui a quatro bancos nacionais, colocando-as em terreno “negativo”, apontando para possíveis baixas nas notações no futuro. A decisão prende-se com a “disrupção causada pelo surto de coronavírus em Portugal”.

Em causa estão Banco BPI, Santander Totta, Banco Comercial Português e Caixa Geral de Depósitos. O Banco Montepio também foi afetado, com a sua classificação a ser colocada numa perspetiva negativa mais apertada, com potenciais efeitos no curto prazo.

O sector português não está aqui sozinho, já que a Moody’s também fez o mesmo ao sector bancário de seis países europeus, incluindo Espanha e Itália (aqui, Portugal escapou), por considerar que as medidas postas em cima da mesa pelos governos não são suficientes para compensar o impacto económico da paralisação que foi decretada nos países para conter o surto.