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Fitch: Montepio com pior rácio de capital e BCP com maior dimensão de ativos problemáticos

A Fitch fez um estudo comparativo de seis bancos – CGD, BCP, Novo Banco, Santander Totta, BPI e Banco Montepio. Comparou o rácio de capital de cada com os requisitos regulamentares e comparou o peso dos ativos problemáticos líquidos no capital de melhor qualidade. O Montepio e o Novo Banco saem pior na fotografia. O BCP tem um maior volume de ativos problemáticos mas estes pesam menos no capital.
  • Cristina Bernardo
3 Agosto 2020, 07h30

O relatório da Fitch intitulado “Rating dos bancos portugueses vulneráveis a uma crise prolongada do coronavírus“, faz uma comparação dos bancos Montepio, Caixa Geral de Depositos, Santander Totta,  BPI e BCP no que toca a folgas de capital e ao peso dos ativos problemáticos no capital das instituições financeiras.

O BPI, CGD e Santander Totta estão numa posição mais forte em comparação com o Banco Montepio, Novo Banco e, em menor grau, o BCP, segundo a agência de rating.

BCP com maior volume de ativos problemáticos, mas o Montepio tem o maior peso dos ativos improdutivos líquidos no capital core

“A deterioração prevista na qualidade dos ativos entre 2020-2021 provavelmente levará a níveis mais altos de oneração do capital pelo ativos problemáticos, embora o setor bancário seja mais resiliente hoje do que durante a última crise. Alguns bancos portugueses ainda têm um elevado peso de ativos problemáticos no capital, tornando sua solvabilidade altamente vulnerável a choques económicos moderados”, diz a Fitch.

A Fitch mede a oneração de capital comparando o volume de ativos problemáticos (empréstimos vencidos), ativos imobiliários, fundos de reestruturação) líquidos de imparidades (que ajusta o valor recuperável) com o capital de nível 1 (CET1) do banco.

“Embora o setor tenha feito progressos significativos nos últimos anos, os níveis de oneração de capital acima de 100% deixariam as métricas de solvabilidade dos bancos altamente vulneráveis na desaceleração económica. Nesse contexto, acreditamos que o Banco BPI, CGD e Santander Totta estão numa posição mais forte em comparação com o Banco Montepio, Novo Banco e, em menor grau, o BCP”, diz a Fitch no seu relatório.

Na sua análise, a Fitch destaca que o BCP tem a maior dimensão de ativos problemáticos, em março somavam 3.897 milhões. Mas o peso no capital de melhor qualidade (CET1), ronda os 72%, dada a robustez do capital.

O BCP tinha em março, segundo a Fitch, 1,759 mil milhões em malparado (unreserved NPL – NPL líquido de imparidades), a que acrescem os ativos recebidos em dação por incumprimento de crédito (foreclosed assets) e 972 milhões em fundos de reestruturação.

O balanço que surge em segundo lugar com maior volume de ativos problemáticos é o do Novo Banco. Em março, segundo a Fitch, somavam 3.776 milhões, repartidos entre 1.489 milhões em NPL líquidos de imparidades; 435 milhões de ativos recebidos em dação de cumprimento; 700 milhões de euros em imóveis; e 1.143 milhões em fundos de reestruturação.

O Novo Banco, na sua apresentação de resultados do semestre anunciou o registo de desvalorização dos fundos de reestruturação (-260,6 milhões) “em resposta à decisão constante na SREP letter do Banco Central Europeu (BCE)”.

“Após uma avaliação independente dos Fundos de Reestruturação, em junho de 2020, o NB registou o justo valor dos ativos em 557,2 milhões, ou seja, uma desvalorização de -260,6 milhões”, lê-se na apresentação. O que se passou, segundo fonte, foi que no contrato do CCA, o banco ficou impedido de realizar a reavaliação do fair value dos Fundos de Restruturação até 17 de outubro de 2019.

Mas entretanto o banco foi notificado pelo BCE para realizar essa avaliação em 2018 e o adiamento que pediu foi considerado uma deficiência na carta de SREP de 2019. Assim, em outubro de 2019 o Banco solicitou a avaliação independente à Alvarez & Marschal, empresa que havia desenhado o plano de redução de NPLs do Banco em 2016. Deste relatório e das interações com o auditor do NB levaram a instituição a registar provisionalmente 260 milhões (valor ligeiramente acima do previsto no orçamento inicial pré-covid, apresentado aos acionistas).

O Novo Banco pretende classificar e “se possível assegurar a venda” destes ativos em mercado. Este ativo é a 80% protegido pelo CCA.

Os ativos problemáticos líquidos do Novo Banco, em março, pesavam 103% do CET1 do banco. Era o segundo banco com maior peso de ativos problemáticos no capital core. O campeão aqui volta a ser o Montepio.

O banco liderado por Pedro Leitão tinha em março 1.818 milhões de euros de ativos problemáticos em balanço, repartidos por 698 milhões de NPL líquidos de imparidades; 609 milhões de foreclosed assets (ativos recebidos por incumprimento);  138 milhões de imóveis; e 373 milhões em unidade de participação em fundos de reestruturação.

O peso dos ativos problemáticos no common equity tier 1 (CET1) do Banco Montepio é de 143%, segundo o relatório da Fitch, que usa dados de março de 2020.

Os ativos problemáticos do Santander Totta em março somavam 1.161 milhões de euros, repartidos entre 596 milhões de “unreserved NPL”; 167 milhões de ativos recebidos por dação em cumprimento; 253 milhões de euros de imóveis; e uma exposição de 145 milhões a fundos de reestruturação. O peso dos NPA (Net Problem Assets) no capital de melhor qualidade (CET1) do Totta é de 40%.

A CGD surge, na análise da Fitch, com 1.495 milhões de ativos problemáticos, repartidos entre 466 milhões de euros de NPL (malparado líquido de imparidades); 275 milhões de ativos recebidos em dação; 205 milhões de imobiliário; e 549 milhões de euros em unidade de fundos de reestruturação. Os Net Problem Assets da CGD representam 20% do CET1 do banco.

Por fim surge o BPI, com um volume muito baixo de ativos problemáticos. Somam 417 milhões , repartidos entre 345 milhões de NPL não cobertos por imparidades; 28 milhões de ativos recebidos em dação e 44 milhões de euros em fundos de reestruturação. Este volume de ativos pesa 17% do CET1 do BPI.

Segundo uma fonte do setor financeiro, o conceito de “unreserved NPL”, aplica-se a créditos em incumprimento líquidos de imparidades (ou o valor que está em risco nesse ativo).

Montepio com rácio de capital abaixo do requisito regulamentar antes das folgas de capital

A análise divulgada na passada quinta-feira, revela que o único banco que tem o rácio de capital abaixo dos requisitos regulamentares é o Banco Montepio.

O estudo da Fitch é feito com base nos dados de 30 de março, e a 30 de junho o rácio de common equity tier 1 (rácio de melhor qualidade) do Montepio caiu de 11,7% para 11,5%, agravando o gap face aos requisitos.

Pode um banco atuar com rácios de capital abaixo dos requisitos regulamentares? Em teoria não. Mas os requisitos regulamentares foram flexibilizados para fazer face à crise da Covid-19 e o Montepio beneficia dessa flexibilização.

A Fitch diz que “dada a tolerância regulatória generalizada, não esperamos intervenções regulatórias automáticas como resultado de os bancos operarem temporariamente abaixo de suas necessidades totais de capital, incluindo aqui os buffers de precaução, desde que sejam capazes de estabelecer um caminho credível para reabastecer esses buffers no médio prazo”. No entanto, avisa a agência de rating, “devido às perspectivas restritas de rentabilidade a longo prazo, alguns bancos podem vir a ter dificuldades para reabastecer esses amortecedores de capital após a crise, o que teria um impacto negativo nos ratings”.

Os requisitos de capital incluem 2,5% de buffer de conservação de capital e os respectivos buffers de O-SII dos bancos (reserva para outras instituições de importância sistémica, que são instrumentos macroprudenciais dos reguladores bancários para mitigar a acumulação de riscos sistémicos), para além da almofada do Pilar 2 que é aplicado pelo supervisor depois de uma análise aos ativos dos bancos (SREP).

O requisito de capital total (um rácio que inclui CET1 e Tier 2) para o Banco Montepio é de 13,9% e o banco está a operar nesta altura com 13,5%. Mas na análise da Fitch, reportando a março, o banco surge com um rácio de capital total de 13,2%.

A melhoria do rácio de capital total no Montepio em junho é em parte justificada pelo do efeito positivo da emissão de divida subordinada no montante de 50 milhões (tier 2 do rácio).

O requisito do rácio de CET1 para o banco liderado por Pedro Leitão é de 9%. O banco estava em março com 11,7% e em junho caiu para 11,5%.

Na lista dos piores surge a seguir o Novo Banco que tem a vantagem de ter um mecanismo de capitalização contingente que cobre deficiências de capital para até ao rácio mínimo acordado, no âmbito da venda, com a Comissão Europeia (12% de CET1).

Segundo a Fitch o requisito de capital total para o Novo Banco é de 13,5% e o banco tinha em março 13,8% e em junho caiu para 12,8%.

Já o CET 1, cujo mínimo regulamentar é de 8,7% para o banco liderado por António Ramalho, a instituição tinha em março um rácio de capital de melhor qualidade de 12,8%. Em junho esse rácio caiu para 11,3% (fully loaded). Apesar disso no comunicado dos resultados do  1º semestre o Novo Banco garante que “terminou o semestre adequadamente capitalizado e com sólidos níveis de liquidez, estando bem posicionado para continuar a apoiar os clientes de retalho e empresas”.

O banco liderado por Ramalho apresentou contas do semestre na passada sexta-feira e nelas revela que tem o seu rácio de Common Equity Tier 1 (CET1) protegido em níveis predeterminados até aos montantes das perdas já verificadas nos ativos protegidos pelo Mecanismo de Capitalização Contingente (CCA). “O montante de compensação a solicitar com referência a 2020, terá em conta as perdas incorridas nos ativos cobertos pelo Mecanismo de Capitalização Contingente bem como as condições mínimas de capital aplicáveis no final de 2020 ao abrigo do CCA”, diz a instiitução. Portanto, o Novo Banco continua com o seu rácio CET1 protegido, tendo este nível de proteção sido fixado em 12% a partir de janeiro de 2020.

O Novo Banco anunciou que “em resultado das perdas verificadas na atividade legacy no valor de -493,7 milhões, que refletem a prossecução do processo de deleverage de créditos, imóveis e outras exposições legacy que estavam no balanço do Banco em 2016, estima, a esta data e para este período de seis meses, um montante a receber de 176 milhões de euros ao abrigo do Mecanismo de Capitalização Contingente”.

Extrapolando para o final do ano estima-se que o Novo Banco venha a pedir em 2021, por conta dos resultados de 2020, acima de 350 milhões de euros ao CCA, abaixo do montante que permanece disponível de 912 milhões.

“Em 30 junho de 2020, o rácio provisório CET1 foi de 12% (Phased-in) e o rácio provisório de solvabilidade total de 13,5% (Phased-in), valores que representam uma redução face aos apurados no final de 2019 devido principalmente à diminuição dos capitais próprios impactados no período pelos efeitos decorrentes da pandemia Covid-19″, justificou o Novo Banco.

O BCP é o terceiro pior no que toca à análise da Fitch, apesar de ter rácios confortavelmente acima dos mínimos regulamentares. O requisito de rácio de capital total é de 13,3% e o banco em março tinha 15,4%. Em junho o Millennium BCP anunciou ter um rácio de capital total (fully loaded) de 15,5%. O banco detalhou que os requisitos de SREP são de um rácio de capital de 13,3%, o que inclui 2,50% de reservas de conservação e de O-SII; 2,25% de Pilar 2 e 8% de Pilar 1 (ou mínimo legal para todos os bancos).

Já no que toca ao rácio de capital CET1, o mínimo regulamentar exigido ao BCP para 2020 está, segundo a Fitch, em 8,8% e o banco tinha em março 12%.

Nas contas de junho o BCP reportou um rácio de capital CET1 fully implemented de 12,1%, acima dos requisitos regulamentares de 8,83% (que inclui para além dos 2,5% de buffers de conservação e de risco sistémico), uma almofada de Pilar 2 de 1,27% de CET1 e o mínimo legal de 4,5%).

Diz o banco que “a diferença do rácio fully implemented para o requisito necessariamente realizável em CET1 é de 1,5 mil milhões de euros, não considerando a utilização das reservas de  conservação e O-SII e de 2,2 mil milhões de euros considerando a utilização das mesmas”.

Depois surge o BPI com um rácio de capital total em março de 16,9%, muito acima do requisito de 12,9% exigido ao banco do CaixaBank.

O banco tem ainda um rácio de CET1 de 13,7% em março, acima do exigido que para o banco é de 8,5%.

“O BPI cumpre por margem significativa os rácios mínimos exigidos pelo Banco Central Europeu (BCE) para 2020 em matéria de CET1, Tier 1 e rácio total”, anunciou o CEO indigitado, João Pedro Oliveira e Costa na apresentação de resultados semestrais.

O banco anuncia apenas os rácios na versão phased-in (com o impacto faseado da implementação das regras IFRS 9) e em junho o CET1 é de 13,8%, o Tier 1 é de 15,3% e rácio de capital total é de 17%. O CEO do banco disse que o rácio de capital CET1 de 13,8% que supera o requisito em 3,95%, e dá uma folga de 700 milhões para poder usar caso necessário.

Segue-se o Santander Totta que em março tinha um rácio de capital total de 19,4%, acima do requisito que segundo a Fitch é de 12,5%. Em termos de CET1 o banco liderado por Pedro Castro e Almeida tinha em março 15,8%, quando o requisito é 9%.

Em junho o Santander Totta reportou um rácio CET 1 (fully implemented – totalmente calculado de acordo com as normas da CRR/CDR IV) de 19,6%, um acréscimo de 3,2 pp em relação ao período homólogo. Na versão phased-in está nos 20,1%.

Já no rácio de capital total o banco português do Santander tem o mais alto face aos concorrentes: 23,4%.

Na análise da Fitch, que reporta a março, a CGD surge como o banco melhor posicionado no que toca ao capital de melhor qualidade (CET1). O banco liderado por Paulo Macedo tinha no fim do primeiro trimestre um CET de 16,6% acima do requisito de 9% (entretanto já foi ultrapassado em junho pelo Santander).

No rácio de capital total a Caixa Geral de Depósitos tinha 19,2% e o requisito regulamentar para 2020 é de 13,5%.

Em junho,  a CGD tem 16,16% de capital core (CET1), “bastante robusto face às necessidades de capital, o que nos dá um conforto de ter capital suficiente para apoiar a economia portuguesa nos próximos anos”, disseram os gestores do banco na apresentação de resultados. O requisito para 2020 é de 9,02% e por isso o rácio da Caixa incorpora uma almofada de 7,6% ou 3,4 mil milhões de euros.

Já em termos de rácio de capital total em junho a CGD reportou 19,1% (ligeiramente abaixo de março).

O facto de o BCE ter divulgado, em 12 março de 2020, diversas medidas que permitem aos Bancos operar temporariamente abaixo do nível de capital exigido, ajudam os bancos, e o Montepio e Novo Banco são os principais beneficiários. Recorde-se que estas medidas visam impedir a suspensão do financiamento à economia pelos Bancos num contexto económico adverso. Mas as almofadas terão de ser repostas, previsivelmente até 2022.

 

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